“Quando eu sinto, eu sinto nos meus ossos. Você já quebrou algum osso? Eu quebrei meu braço direito uma vez. Lembro-me de ouvir pessoas falando o quão insuportável era a dor de quebrar um osso. Mas eu não achei tão insuportável assim, uma vez que percebi que sempre senti no peito a dor de ossos quebrados.”
Eu ainda encarava fixamente o movimento das ondas, não conseguia olhar para ela – não conseguia me mexer. O medo me paralisou naquele instante que parecia se estender por uma eternidade e de imediato desejei voltar no tempo, quando ainda havia a chance de segurar as palavras que eu impulsivamente vomitara. Podia sentir o olhar dela, o brilho de seus olhos que chegavam a queimar minha pele quando ela os direcionava a mim. O silêncio e a inércia pairavam sobre nós e minha angústia crescia. Um abismo se abria entre nossas mãos afastadas e ainda que estivéssemos ali paradas, eu sentia ela se afastando gradualmente, até que esse abismo tornou-se maior que o oceano à nossa frente. O meu corpo tremia e gritava pelo calor do dela, e tudo que eu queria era pedir que ela me envolvesse no abraço que eu não tinha coragem suficiente de buscar. No único abraço capaz de juntar os cacos que eram a minha alma e me libertar da constante dor de ossos quebrados.
Eu sabia que ela jamais viria até mim se eu não desse o primeiro passo e eu queria mais que tudo alcançá-la, tocá-la Queria ser levada por ela. Ela era tão linda… Eu ansiava pelo toque dela como nunca antes havia ansiado por algo. Sempre tão atraente, desejável, irresistível. Por que eu insistia em afastá-la com meus pensamentos todas as vezes em que eu conseguia trazê-la para perto de mim? Ela estava ali, bem do meu lado, e tudo que eu precisava fazer era estender a mão. Mas eu ainda não conseguia.
“Você não quer isso. Não agora, não assim.” Ela disse, quebrando o silêncio. Eu ainda não conseguia fazer com que meus músculos obedecessem aos comandos do meu cérebro; sentia apenas as lágrimas, que embaçavam minha visão e escorriam pelas minhas bochechas. Eu ouvi o barulho de seu corpo se mover quando ela se levantou e tornou real a distância que antes era abstrata. “Eu vou sempre estar aqui”, ela disse ao dar as costas para mim e caminhar pela areia em direção ao horizonte, sem olhar para trás.
Eu a vi se afastando e não tive coragem de levantar para trazê-la de volta. Eu vi, através dos meus olhos marejados, sua silhueta tornar-se um vulto cada vez mais distante. E assim A Morte, mais uma vez, escapava de mim.