Palpites

Por Clarissa Roldi

Apenas pelo título desta crônica vocês já sabem que vão passar raiva. Só de ler essa palavra, o sangue já ferve, não é mesmo? O meu sim. Tem umas sortudas por aí que tiveram um pouquinho de educação emocional e conseguem controlar a língua e manter a boa convivência com os palpiteiros. Eu não sou uma dessas pessoas. Eu evito ser grosseira, mas não posso prometer segurar o deboche – pedir isso é abusar da minha limitada paciência, que já precisa ser usada para lidar com uma criança. 

Meu filho deveria ter por volta de 4 meses quando uma senhora na fila do banco me olhou torto quando me viu com meu filho mamando amarrado no sling. Ela direcionou a palavra à mim como se fôssemos amigas de longa data:

“Você não tem medo de que seu filho não aprenda a andar, amarrado no peito desse jeito?”

Eu dei o meu melhor sorriso para responder. Juro. 

“Amada, se eu quisesse que meu filho nascesse andando, eu teria parido um potro. Tá falando com a mãe da espécie errada.” 

Eu não entendi por que ela fez uma cara tão grande de espanto. Eu até dei uma risadinha para amenizar as coisas! As pessoas não tem senso de humor, tsc. 

Eu também nunca entendi por que tantos pediatras ficaram ofendidos quando perguntei se eles tinham se formado na faculdade de medicina do Dr. Seuss. Eu simplesmente não conseguia formular uma pergunta diferente dessa quando me diziam que eu tinha que parar de amamentar para não deixar meu filho mal acostumado. Digo… meu amor, amamentar em livre demanda é uma indicação bem simples da Organização Mundial de Saúde, afinal de contas. Médico que não “concorda” com uma evidência científica tão clara e objetiva só pode ter comprado o diploma. 

E a vizinha enxerida que reclamou do barulho que eu fazia andando pela casa com meu bebê recém nascido de madrugada? Na lata: “verdade, eu preciso parar de andar por aí de madrugada. Quando você vem aqui cuidar dele para que eu fique deitada? Tô mesmo precisando de um descanso.” A mulher tomou tanto ódio de mim que nunca mais me deu um bom dia sequer ao cruzar comigo nos corredores, ainda que eu seguisse cumprimentando com meu lindo sorriso. Ué, eu dei a solução para o problema dela, por que ficou tão azeda comigo? 

O meu deboche é tão parte de mim que ele saiu até sem querer na maternidade. Recém saída do pós cirúrgico. Ainda nem conseguia andar. Estava lá eu, sofrendo para amamentar. Bebê aos berros. Eu já tinha tomado a decisão de não dar chupeta – graças a uma super aula do pessoal de fonoaudiologia para as gestantes no meu pré natal – e  nem levei na bolsa as que eu ganhei dos palpiteiros enchedores de saco.

“A chupeta vai ajudar a acalmar seu bebê, você não tem não?” Disse a sogra de uma outra mulher que estava lá junto comigo. 

Eu acho que nem pensei demais, quando me dei conta já tinha respondido: “Bom, se chupeta servisse para ajudar bebês, já viria acoplado nas tetas, né?”

E talvez vocês ainda não tenham reparado, mas o deboche é uma coisa contagiante. Quem fica perto de gente debochada parece absorver tal atributo para si. E quando perguntaram por que meu filho aos dois anos ainda usava fraldas, quem disse que era porque “ele ainda prefere não sair por aí soltando merda” foi o titio. 

Agora eu admito que às vezes posso ser um pouco cruel. Quando o palpite vem de gente próxima, eu uso exemplos práticos sem o mínimo de pudor. A senhorinha que foi minha vizinha adorava dar pitaco sobre o que eu deveria ou não fazer. 

“Porque o seu filho é uma dádiva que não sabe nem lavar as próprias cuecas, né? Mal espero para fazer igualzinho e criar um filho totalmente inútil!”

Acho que a mulher teve seus motivos para criar tanto ranço da minha pessoa.

Você pode até pensar que essa minha forma de abordar palpites afastou muita gente de mim. E é verdade, afastou mesmo. Ao mesmo tempo, trouxe para mais perto quem tem um pensamento mais alinhado com o meu e não sente a necessidade de se meter constantemente na forma como escolho cuidar da minha cria. Quem quer, de fato, ajudar, não dá palpite – isso eu posso afirmar com toda certeza. Quem quer ajudar pergunta, procura, pesquisa, quer saber como você está. Eu tenho essa teoria de que palpiteiros são seres com grandes frustrações que não conseguem viver com seus erros e só se sentem melhor vendo outros cometerem os mesmos erros. Acho que assim eles acham que pode dar uma “amenizada” no erro. Mas isso é só uma teoria, acho que para desvendar a cabeça de um palpiteiro só muita psicoterapia mesmo. 

Mas enfim, o ciclo é sempre o mesmo – palpites, deboche, cara feia… E agora uma gargalhada bem sonora do meu filho que certamente está aprendendo a ser debochado como a mãe. E nessa vida, eu tenho uma certeza absoluta: a de que ele ainda vai me fazer pagar a minha língua na mesmíssima moeda. 

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